UMA HISTÓRIA PARA COMEÇAR
Ela veio de longe. Filha de uma família libanesa, chegou ao Brasil acompanhada de um parente distante. Veio ao encontro de um tio que morava por aqui. Chegou, e já tinham arranjado um casamento para ela. Não soube se opor. Estava frágil demais para querer alguma coisa.
Trinta e dois anos se passaram. Oito filhos; sete homens e uma mulher. Cinco netos e uma história de sofrimento que parece ter saído de algum clássico da literatura. Nos primeiros dias de convivência ele deixou claro, por meio de sua conduta, que a vida ao seu lado não seria fácil.
A mulher não sabia sorrir. Os filhos já criados herdaram do pai a mesma personalidade. A única filha rebelou-se contra a estrutura familiar e foi embora para nunca mais voltar.
A mulher não sabia nem o que me pedir. Confessou ter medo de tudo. Medo da vida, medo da morte, medo dos filhos, medo do marido morto.
Aquela mulher tinha, diante de si, uma longa viagem a ser feita. Ela precisava retornar ao momento em que permitiu que o homem recém-chegado tomasse posse de sua vida.
Ela foi vítima de um seqüestrador. O seqüestrador chegou no momento em que sua vida estava frágil. Descobriu nela uma vítima fácil. No princípio uma violência velada; depois, a violência declarada, gritada para quem quisesse ouvir.
Sem muitas possibilidades na vida, a mulher submeteu-se ao tratamento cruel. Mesmo agora, com as portas de seu cativeiro abertas e sem a ameaça de seu agressor, ela não sabia mais dar o passo em direção à liberdade que lhe cabia.
Este é um caso clássico de seqüestro da subjetividade; esta espécie de roubo de alma; este absurdo que costuma morar ao nosso lado, ou dentro de nós.....
EE