RELAÇÕES QUE SEQUESTRAM
Como vimos, o processo de ser pessoa está diretamente ligado à problemática do seqüestro da subjetividade. A razão é simples. Se uma pessoa está privada de ser ela mesma porque alguém a trancafiou em uma relação de seqüestro, é bem provável que ela deixe de dispor de si mesma e conseqüentemente deixe de dispor-se aos outros. Por isso, temos duas realidades dignas de análise que podem ser assim simplificadas: ou vivemos só para nós ou vivemos só para os outros. Nos dois casos há um grande erro sendo cometido.
Viver a dinâmica que o conceito de pessoa nos sugere é trabalhoso.
O eu, na solidão, sem interação, não poderá crescer. O que dispões de si mesmo carece de entrar na disponibilidade das relações. Elas o aperfeiçoarão.
Por outro lado, a conjugação deste nós, sem que antes tenha ocorrido a disposição do eu, caracteriza-se como forma de comunitarismo infértil.
Antes da disponibilidade para o outro, é indispensável a disposição de si. Só quem é dono de si pode oferecer aos outros sem tantos riscos de se perdr no outro.
Desafio consiste em equilibrar os dois pilares. As duas realidades se complementam.
Relações que seqüestram são aquelas em que um eu tenta sufocar outro tu, reduzindo-o a mero instrumento de sua afirmação
Alguém, quando é colocado na condição de algo, vive a negação de sua dignidade; desumaniza-se, porque deixa de ser considerado como pessoa.
No seqüestro da subjetividade o seqüestrador passa a ser o proprietário. O seqüestrado permite essa relação. O medo de ser deixado, abandonado, o encoraja a sofrer todos esses malefícios. Nesse caso, vale aquela máxima popular: “Ruim cm ele, pior sem ele!”
O cativeiro por pior que seja, acabou por se tornar um lugar seguro. O seqüestrado está esquecido da vida livre; já não sabe como é ser gente fora das prisões. Esqueceu que é rei e vive como se fosse escravo.
Quem sobrevive de qualquer maneira facilmente também se considera qualquer pessoa.
É a cultura do “qualquer jeito” que tem anestesiado tanto as pessoas para as transformações necessárias.
Este é o resultado psicológico desta modalidade de seqüestro. O que temos é uma vítima acostumada com a violência que sofre. Violência sutil, velada, que não tem as mesmas características do ato violento declarado.
Obra: Quem me roubou de mim
Autor: Fábio de Melo
Paginas 68-71
Editora Canção Nova
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